Base normativa da política de cotas na pós-graduação

A Universidade de Brasília (UnB) adota uma política de cotas (ações afirmativas) em todos os seus programas de pós-graduação, incluindo o Mestrado Profissional em Direito, Regulação e Políticas Públicas. Esta obrigatoriedade decorre de normativos federais e institucionais que estabelecem a reserva de vagas para grupos historicamente excluídos, com o propósito de promover a diversidade no ambiente acadêmico.

Inicialmente, no âmbito federal, a Portaria Normativa MEC 13/2016 determinou que as Instituições Federais de Ensino Superior apresentassem propostas de inclusão de negros (pretos e pardos), indígenas e pessoas com deficiência em seus programas de pós-graduação.

Em atendimento a essa orientação, foi editada a Resolução CEPE 44/2020, a qual dispõe sobre a política de ações afirmativas para estudantes negros, indígenas e quilombolas nos cursos de pós-graduação da UnB. Essa resolução estabelece, no Art. 1º, §1º, que “em todos os processos seletivos da pós-graduação” da UnB devem ser reservadas no mínimo 20% das vagas para candidatos(as) negros(as), além de pelo menos uma vaga adicional para candidatos(as) indígenas e uma para candidatos(as) quilombolas.

Tais percentuais e reservas são aplicáveis universalmente em todos os programas de mestrado e doutorado da UnB, sem exceções por se tratar de curso profissional ou financiamento específico, conforme os normativos internos. Ademais, a Lei 14.723/2023, atualizou o sistema de cotas no ensino superior federal e explicitamente estendeu as políticas afirmativas para os cursos de pós-graduação. Essa lei reforça o caráter obrigatório das cotas em todos os programas de pós-graduação das instituições federais, alinhando-se às iniciativas que a UnB já vinha implementando nos anos anteriores.

Evolução histórica da política de cotas na UnB

A UnB possui uma trajetória pioneira na adoção de políticas de ação afirmativa. No ensino de graduação, a Universidade de Brasília foi uma das primeiras instituições públicas do país a implementar um sistema de cotas. Após debate interno e na sociedade, a política afirmativa da UnB foi aprovada em 2003, resultando no primeiro vestibular com reserva de vagas no ano de 2004.

Naquela época, a UnB passou a reservar 20% das vagas de cada curso para estudantes autodeclarados negros (pretos ou pardos), além de implementar vagas específicas para indígenas, mesmo antes da existência de uma lei federal que exigisse tal prática. Essa iniciativa pioneira foi acompanhada de debates, inclusive judiciais. Assim, em 2012, o sistema de cotas da UnB foi contestado judicialmente e acabou referendado pelo Supremo Tribunal Federal, que declarou a constitucionalidade das políticas de ações afirmativas no ensino superior. A partir desse marco, consolidou-se a expansão das cotas em nível nacional, com a promulgação da Lei 12.711/2012.

Nos anos subsequentes, a UnB não apenas manteve como ampliou a política de cotas. Nesse movimento, promoveu debates envolvendo conselhos e câmaras de pós-graduação, com participação de docentes, estudantes e movimentos sociais, para estruturar um modelo de cotas na pós-graduação.

Conforme mencionado, esse processo culminou na elaboração da Resolução CEPE 44/2020, que inspirou outras universidades a seguir o mesmo caminho. Nessa época, apesar de tentativas pontuais de retrocesso em nível federal (como a Portaria MEC 545/2020, que chegou a revogar a portaria de 2016, mas foi prontamente anulada dias depois), a política de cotas na pós-graduação saiu fortalecida. E, em maio de 2021, já se observava que quase metade das universidades federais adotavam ações afirmativas em todos os seus programas de pós-graduação, muitas inspiradas por experiências bem-sucedidas como a da UnB.

Para além das categorias descritas, a UnB também implementou ações afirmativas para pessoas com deficiência (PcD) na pós-graduação. Isso decorreu da aprovação, na Câmara de Pesquisa e Pós-Graduação, da Resolução CPP 05/2020, que instituiu a reserva de vagas para candidatos com deficiência em todos os programas de pós-graduação.

Comissão de Heteroidentificação e verificação das autodeclarações

Para assegurar a integridade e correta aplicação da política de cotas raciais, a UnB conta com um procedimento formal de verificação das autodeclarações dos candidatos que concorrem pelas vagas reservadas para negros (pretos e pardos).

Esse procedimento é realizado por uma Comissão de Heteroidentificação, previamente constituída e que tem um calendário próprio. A base normativa para esse mecanismo inclui as resoluções internas da UnB – notadamente a própria Resolução CEPE 44/2020, que prevê a existência de bancas de heteroidentificação para validar a condição declarada dos candidatos cotistas – e segue as diretrizes gerais estabelecidas por normativas federais, como a Portaria Normativa MEC 4/2018, que regulamenta procedimentos de heteroidentificação em concursos públicos e inspirou os protocolos nas universidades.

A Comissão de Heteroidentificaçao é composta por no mínimo três membros, designados especificamente para avaliar os candidatos cotistas. A UnB constituiu também um Comitê Permanente de Acompanhamento das Políticas de Ação Afirmativa (COPEAA-UnB), via Resolução Cepe 90/2022, responsável por homologar a composição dessas comissões de heteroidentificação e de eventuais comissões recursais, garantindo que sejam formadas por integrantes com capacitação e idoneidade para a função.

A comissão pode incluir docentes, técnicos e até membros externos à universidade, como representantes de movimentos sociais (do movimento negro, indígena ou quilombola), de modo a assegurar diversidade de perspectivas e credibilidade no julgamento. Há critérios de heterogeneidade na escolha dos membros – sempre que possível, busca-se diversidade de gênero, raça e origem regional entre os avaliadores – conforme as melhores práticas recomendadas nacionalmente.

Os candidatos negros que optam por concorrer às vagas reservadas precisam, após passarem nas fases acadêmicas do processo seletivo, submeter-se à entrevista de verificação da sua autodeclaração racial. Durante essa entrevista, a comissão observa as características fenotípicas do candidato de forma presencial (ou por videoconferência, se o processo for remoto), sendo vedado ao candidato o uso de quaisquer elementos que dificultem a avaliação, como acessórios que alterem sua aparência (bonés, óculos escuros, maquiagens excessivas etc.). Todo o procedimento é conduzido com respeito à dignidade da pessoa, em ambiente reservado, e é gravado em áudio e vídeo para registro oficial. A gravação serve tanto para transparência e arquivo quanto para subsidiar eventuais recursos.

A comissão decide de forma colegiada, logo após a entrevista, se homologa ou não a autodeclaração do candidato. Os princípios do contraditório e da ampla defesa são assegurados: caso o candidato tenha sua autodeclaração indeferida (não reconhecida) pela comissão de validação, ele terá direito a apresentar recurso a uma instância revisora. Para tanto, a UnB também instituiu a Comissão Recursal de Heteroidentificação, composta nos mesmos moldes da comissão inicial, mas com membros distintos, à qual o candidato pode recorrer para uma segunda avaliação independente. Somente após esgotadas essas etapas (validação e, se necessário, recurso) é que o resultado do processo seletivo é consolidado, garantindo que apenas candidatos que efetivamente pertençam aos grupos alvo das cotas ocupem as vagas reservadas.

A fundamentação legal para a atuação dessas comissões apoia-se, além dos normativos internos já mencionados, em dispositivos do Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/2010) e em princípios da Administração Pública. Em especial, seguem-se princípios como: respeito à dignidade da pessoa humana; contraditório e ampla defesa; devido processo legal; igualdade de tratamento; publicidade e controle social do procedimento; e efetividade da política afirmativa. Tais princípios norteiam os trabalhos das bancas de heteroidentificação, assegurando que o processo seja técnico, imparcial e transparente, e coibindo fraudes ou declarações indevidas. Em síntese, a comissão de heteroidentificação é um mecanismo essencial para garantir a lisura e a justiça na implementação das cotas, confirmando que os benefícios das vagas reservadas alcancem de fato os candidatos a que se destinam.

Mais detalhes podem ser consultaos aqui: https://dpg.unb.br/acoes-afirmativas/calendario-da-comissao-de-heteroidentificacao

Em conclusão, a observância da política de cotas no PMPD não é apenas um imperativo legal, mas também um reflexo do compromisso da Universidade com a redução das desigualdades e a promoção de oportunidades educativas para grupos sub-representados. Assim, órgãos públicos e instituições parceiras do mestrado profissional podem ter a confiança de que o programa segue estritamente as diretrizes de ações afirmativas vigentes, contribuindo ativamente para a formação de profissionais altamente qualificados em um ambiente acadêmico diverso, inclusivo e alinhado às políticas públicas nacionais de equidade.